Lightworkers - Trabalhadores da Luz

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 (o doutrinador conversa com o espírito incorporado no médium)

Este companheiro não se apresentou agitado nem agressivo, mas, também, não era daqueles que procuram mistificar com fingida doçura de voz e de palavras. Mostrava-se seguro de si e se declarava pronto para um “diálogo fraterno”. Não havia motivo para “parlamentação”, uma vez que seus planos estavam seguindo como desejavam os componentes da sua equipe. Vinha apenas conversar. Trazia informações e vinha colher outras tantas. O tratamento era ameno e, no seu dizer, com toda a “lhaneza”, revestido dos melhores “propósitos fraternos”.

Quanto às informações que desejava, não é porque não dispusesse de registros e fichários; é que, uma delas, de vital importância para o seu trabalho, não fora ainda expressamente formulada na mente do nosso doutrinador, pois se referia a uma atitude ou decisão a ser tomada em futuro próximo.

Depois de todos esses rodeios e circunlóquios, faz a pergunta mais especificamente:

— O que pretende o cavalheiro fazer daqui por diante? Qual o próximo passo que pretende dar?

A resposta foi simples e breve:

 Seguir o Cristo, tanto quanto nos permitem as nossas imperfeições.

Retrucou que já esperava coisa semelhante, partindo de quem partia, mas isso era muito vago, porque seguir o Cristo ele também seguia, pois há maneiras pessoais de fazê-lo. De sua parte, por exemplo, na condição de Espírito em que se encontrava, não tinha mais paixões humanas — tinha ideais. Quanto ao poder, era uma necessidade, digamos, operacional, em vista das coisas importantes que precisava realizar.

Quem tivera mais poder do que o Cristo? Que seria de nós se não lhe fossem outorgados tantos poderes? Pois era a mesma coisa. Ele, Espírito, também utilizava dos poderes de que dispunha para servir. Tinha condições, por exemplo, para proporcionar paz e felicidade àqueles que o serviam.

É claro que esse linguajar eivado de metáforas e eufemismos precisa ser entendido no seu exato significado. A experiência em lidar com eles acaba criando nos ouvintes um mecanismo de “tradução” automática e simultânea. Ao dizer que tinha poderes para proporcionar paz e felicidade aos que serviam à sua causa, estava apenas confirmando que comprava adesões a troco de favores. Mostrou-se, pois, muito agastado com o doutrinador, quando este lhe disse que não podemos dar aquilo que não temos: paz ou felicidade.

Esquecido o incidente, prosseguiu dizendo que não compreendia por que razão, sendo o nosso doutrinador um Espírito sempre engajado em movimentos reformistas, recusava-se agora a reformar conceitos inteiramente superados na Doutrina Espírita, com o que se colocava na retaguarda. O doutrinador argumentou que as reformas de antanho tinham por finalidade precisamente a preparação do trabalho de agora, que estava divulgando conceitos básicos da vida, como imortalidade, reencarnação, comunicabilidade entre Espíritos e homens encarnados.

Nosso companheiro, porém, dotado de brilhante e ágil inteligência, estava quase sempre muito bem preparado para contra argumentar. Não. Não queriam “eles” reformar a doutrina nos seus conceitos fundamentais mas, sim, reformular a atitude do homem perante a Doutrina. O homem deve levantar-se, crescer espiritualmente, utilizando-se da força e do poder da sua inteligência, pois, como diz a Doutrina, o Espírito é o ”princípio inteligente do universo”.

O exercício da mediunidade de incorporação era, a seu ver, um método grosseiro e superado de trabalho. Ele, por exemplo, não prejudicava o médium, porque não trazia vibrações deletérias, como tantos outros, mas havia muitos que as tinham. A psicografia era algo muito mais refinado, de mente-a-mente.

O homem precisava deixar a servidão, comandando seu destino e suas emoções pela força da inteligência. Não podia ficar “amarrado ao carma”; era preciso “dinamizar esse carma” — expressão dezenas de vezes repetidas em outras tantas conversações desta natureza. Era preciso “transformar o carma numa força atuante” e isto somente seria possível fazer com a inteligência. Nada de ficar de cabeça baixa, parado na vida, chorando erros. Não! Os atos positivos anulariam os atos negativos do passado. Sofrimento é passividade. Até o amor precisa ser dinamizado. Saudade de entes queridos? Sim; mas recordação alegre, feliz, de quem viveu momentos de felicidade com aqueles seres e não de tristeza pelo que não se gozou. A inteligência precisava comandar também o coração.

O próprio Cristianismo devia ser racionalizado. O Evangelho é inteligente, o homem é que não sabe como racionalizá-lo. Foi dinamizando a mente de cada um que o Cristo conseguia que os doentes se curassem, ou seja, com seus próprios recursos. Sem os poderes e a ajuda de Jesus, aqueles pobres infelizes de parca inteligência não tinham como curar-se, pois não sabiam de que maneira “dinamizar” os seus carmas. Tanto é que precisavam ter fé para obter a cura.

O próprio Cristo dissera que se tivéssemos fé do tamanho de um grão de mostarda seríamos capazes de remover montanhas. “Fé em vocês mesmos”, dizia o Espírito. A tarefa “deles” consistia, pois, em incentivar esse aspecto, despertar no homem a consciência de sua própria força.

 Nós vamos dar ao homem condições para transportar montanhas — declarou enfaticamente.

Em linhas gerais, essa era a temática da sua filosofia, destilada de um diálogo de mais de uma hora. Declarou mesmo que dava “esclarecimentos sobre questões evangélicas em reuniões de estudo” em alguns grupos, pois era preciso preparar a inteligência do homem para a segunda vinda do Cristo, conforme prometida, “o Cristo-Espírito, não o homem, o Cristo-Anjo, o Cristo-transcendente” que, por certo, precisaria de homens inteligentes, “libertados” de erros passados por meio da tal “dinamização” do carma.

Aí está, pois o rápido perfil filosófico do querido irmão. Obviamente, ele tinha problemas sérios de aceitação do Cristo, de Seus ensinamentos e da Doutrina Espírita, a despeito de sua declaração formal de servidor da seara cristã. Não passou despercebido, também, que tinha uma fixação qualquer na questão dos chamados milagres, pois deixava supor que Jesus nada mais fizera senão ajudar que as próprias pessoas se curassem a poder de recursos de inteligência.

Ademais, por que razão essa monocórdia cantilena sobre as virtudes superiores da inteligência? Por que a fuga deliberada ao passado em que tudo isso se traduzia, afinal de contas?

 É preciso preparar o advento do Cristo — diz ele — Acho muito estranho que você, que sempre foi um reformista, não queira agora aderir ao movimento. É preciso preparar.... Você acha que o Cristo virá naquela forma grosseira, aquele corpo, ali, roçando no homem comum? Não. O Cristo virá de forma transcendente. Não daquela forma grosseira mais. Temos que preparar o homem para aceitar o Cristo-Princípio-Inteligente, o Cristo-Espírito, não o Cristo-Homem, meu caro. É o Cristo-Anjo... Estou falando alguma coisa que não está nas Escrituras? Temos que esperar o Cristo Evangélico, o Cristo transcendente. 

É isso... Não. Não mais aquele Cristo andando de sandálias, nas margens daquele lago, misturado com leprosos mal cheirosos. Aquela gente tinha um mau cheiro que era um horror! Que mau cheiro! E aquele calor horrível! Aqueles panos envoltos naquelas mulheres... O novo Cristo não vai passar por essa humilhação, por essa degradação da sua condição de ser angélico. Está compreendendo? Não vai mesmo. Nada de Filipes... Nada disso! Filipe? Quem é Filipe? É o novo Cristo que renasce no coração do homem: O Cristo-Inteligência. Só as faculdades ditas intelectuais vão sobreviver nessa era; as outras não, porque as outras... Sabe o que elas conseguem fazer? Elas rebaixam o homem...

Como se verifica, mesmo no correr desta exposição de suas ideias, já começa a mergulhar nas suas recordações: a referência ao lago, ao calor, à pobre gente maltrapilha não se apresentam na sua palavra como produtos puramente imaginários, sacados aqui e ali de páginas literárias; elas trazem aquela íntima convicção que somente a lembrança pode emprestar.

O doutrinador deixa-o desfiar seus conceitos, entre os quais fragmentos de lembranças começam a emergir. A voz já está algo pastosa e sonolenta, mas ele acha que, agarrando-se às ideias que adota no presente, conseguirá escapar daquele mergulho “perigoso” no passado.

 Porque você veja bem: chega um Espírito dementado numa sessão de doutrinação. Desequilibrado, vibrações desarmônicas, exalando um cheiro psíquico nauseabundo... É por isso que os médiuns têm náuseas... Então, incorpora-se, como vocês dizem, no corpo do médium. Sabe lá o que é isso? O choque vibratório que aquela combinação de fluidos proporciona? E depois? (Hesita, gagueja, repete e continua:) Depois... Depois da reunião ele vai estar cansado, doente. E o que você conseguiu? Nada. Ai... não posso falar... Nem meus olhos abertos estou conseguindo manter.

Insiste, porém, em que o doutrinador não tem condições de induzi-lo e insiste em convidá-lo a participar do trabalho de preparação do homem para o Cristo-Inteligência, o Cristo-Força, etc. O sono magnético o domina, afinal. O doutrinador induz à regressão. Ele ainda resiste por algum tempo, até que começa a falar, ainda aos poucos...

 Você volta para Cafarnaum sozinho, meu caro. Sozinho prá lá. Você que viveu lá... Eu não sou de lá. Sou de Chipre, meu caro. Vai para Cafarnaum sozinho. Eu não vou junto com ninguém. Aquilo lá está muito mudado. Já não é mais o mesmo lugar. Como é que se ia de Chipre para Cafarnaum? Você nem sabe. Como você ia? Só de barco? Tem certeza? De que barco você ia? Não lembra. Havia barcos e barcos... Aquilo é um bom lugar, mas eu só guardo as lembranças felizes, como te disse. Eu sou feliz... Vai sozinho. 

Não tenho nada que ver com Cafarnaum. Vai sozinho, meu caro. Não estou aqui prá isso, não. Minha casa é outra. Minha casa está protegida contra isso. Cafarnaum... Que era Cafarnaum? Não perdi nada lá. Sou de Chipre. Sou de Chipre, moro em Chipre. Não tenho nada que ver com Cafarnaum. Que tenho lá? Só vou lá para vender, para comerciar, mais nada...

Sem dúvida alguma ele teve oportunidade de ver lá o Cristo e ouvir a sua pregação ou a de seus seguidores, porque fica a repetir que só vai lá para comerciar, e prossegue:

— O que eu aprendi lá? Não vou, não. O que a gente vai fazer em Cafarnaum? Na praia? Por que na praia? Tira essas crianças daí. Por que as crianças? Não posso... Minha função é... eu tenho que... que debandar a multidão. Não posso deixá-los aí aglomerados. Isso é manobra política, alta traição... Tenho que debandar... Diabo de Cafarnaum... Que lugar horrível! Vocês são todos uns loucos... Quem é essa criança aí no fundo do barco? É sua filha, não é sua filha? É sua filha! É sua.

Rejeita as lembranças, o local, o amigo, e até a menina que vê deitada no fundo do barco. Quando, porém, o doutrinador lhe pergunta como é que ela se chama, ele responde logo:

 Míriam. (Fica a repetir o nome e continua:) É sua filha. Que olhos grandes, bonitos! Olhos pretos, grandes... A peste... a peste...

 Ele a curou?

 Não curou ninguém. Não! Não tenho filha! É sua filha! Míriam. Saudade da minha Míriam... aqueles olhos grandes... Míriam. Quem é Míriam? Míriam... É uma conspiração contra o Tetrarca. Míriam! Cure a Míriam! Cure a Míriam! Que tem ela? Ela tem essas manchas. Que são essas manchas roxas?... Manchas nela... Tira essa confusão da minha cabeça! Manchas roxas... Ódios... lágrimas... Mas eu não posso. Quem é Cristo? Um homem do povo. Eu não sou homem do povo. Ele é um feiticeiro... Míriam... Eu devia dar parte dEle. Ah! que confusão na minha cabeça... Só vejo Míriam e os seus olhos grandes. Que você quer com isso? Você vai prá Cafarnaum. Você vai...

E agora, então, a história verdadeira:

— Você vai. Você leva a Míriam.

 Levo. com todo o prazer.

 Você leva a Míriam... Que confusão na minha cabeça! Estou lá e estou aqui... estou lá e estou aqui... (Ao mesmo tempo que revive um episódio remoto, tem consciência residual do momento presente, em que está ali a discutir com o doutrinador). Você leva a Míriam.

 Sim, levo. Para quê? 

 Não posso levar. Não posso ser visto. Leva. A Rute está desesperada. Leva a Míriam... Quem voltou? A Míriam?

 Ela voltou?

 Sem as manchas... A Míriam sem as manchas. Que horror! A minha filha! Cafarnaum... Que horror! Que cena é essa? Estão passando um cinema aí para mim. Quem é este homem? Não tenho nada com este homem. O próprio discípulo dEle O negou. Só porque Ele curou a Míriam? Feiticeiro. Feiticeiro é que cura. Ele não podia! Não tinha ordem do rei... E o que Ele faz ali? Você está querendo que eu lembre o quê? Que eu fique com remorso?

 Não. Quero que você se lembre que Ele te amou e amou à sua filha. Curou-a. Restituiu-a à sua Rute. Por que você o detesta?

 Quer que eu tenha remorso? Por que, então, você o está mostrando ali, no meio daquela gente? Mas o “outro” lavou as mãos. Eu é que vou fazer alguma coisa?

 Ele fez por amor. Não fez para te cobrar.

 Devo a Míriam. Mas eu perdi a Míriam. Perdi a Rute. A Míriam e a Rute.

 Onde estão elas hoje?

 com Ele.

 E por que você não vai também? Vamos ao encontro delas?

— Deixaram-me por causa dEle.

 Não deixaram. Você é que não quis ir, meu irmão. Até hoje. Elas estão à sua espera.

 Não tem eco...

Sente o coração vazio, pois durante muito tempo programou-se para sufocar o afeto, a fim de que brilhasse a inteligência, atrás da qual passou a esconder-se das suas frustrações emocionais e de angústias milenares.

 Você não tem mais nenhum amor por Míriam e pela Rute?

 Onde estão Míriam e Rute? Só um nome. Não vibram em mim. O amor morreu. O amor é uma razão... O Cristo condenado... Eu assisti a tudo. E não disse a ninguém que Ele curou a Míriam. Não diria nunca. O Cristo... Estou perdido! Você me dobrou, hein? Você me dobrou!

 Não. Você apenas reconheceu a existência do amor. Você é meu amigo ou não é?

 Onde está Jesus? Onde está Ele? Onde está que não vejo... Onde está Ele?...

Não ficamos sabendo, ao certo, qual a posição deste companheiro no contexto da época. Seja como for, depreende-se, do que disse, ter sido um comerciante de recursos e certa influência social, pois menciona o Tetrarca, a quem parece ter tido acesso e também deixa perceber certa familiaridade com Pilatos, “o outro”, que lavou as mãos. Seria, talvez, um judeu não muito ortodoxo, originário de Chipre, já com alguns recursos, pois deixa perceber, também, que não veio, como o seu companheiro de diálogo, em qualquer barco. “Há barcos e barcos”, disse ele.

Ante a doença da filha, uma praga terrível e incurável, pediu ao amigo que, como ele, era também de Chipre, para levar a menina a Jesus. Ele não “poderia ser visto” fazendo aquilo, envolvendo-se com aquela gente miserável, maltrapilha e mal-cheirosa. Provavelmente levara a filha a Cafarnaum, mas dali até o Cristo não queria ir por causa da grossa camada de orgulho. Gravou-se para sempre na sua retina espiritual a cena da sua querida Míriam de olhos negros, grandes e belos, deitadinha no fundo do barco. Ela ficou curada, é certo, mas ele diz que perdeu Míriam e Rute, a esposa, que se converteram ao Cristianismo nascente, enquanto ele ficava com seu orgulho, seu “status” social, sua fortuna, seus negócios.

Enfim, a história de sempre... e as agonias de sempre na angústia que nascia como espinhoso cactus, a separar aqueles que estavam prontos para seguir o Mestre Nazareno daqueles que viam nEle apenas um aventureiro vulgar, um feiticeiro barato, um subversivo perigoso, inimigo das mais sagradas instituições humanas: a riqueza, as rígidas crenças religiosas da época, o brilho e a pompa do poder efêmero.

Ele é tão grande que muitos foram os que somente puderam contemplá-lo na longa e distante perspectiva dos milênios. Coisa curiosa, porém: aquela gente mísera, coberta de andrajos, faminta e desprezada, aqueles párias humildes identificaram logo nEle algo de puro e belo, que não podiam definir com a mente, mas que foram capazes de amar de todo o coração.

Fonte: http://ensinamentos-esotericos.blogspot.com/

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