Ensinamentos Esotericos - O MERCADOR DA SAMARIA – Hermínio Miranda


 

(o doutrinador conversa com o espírito incorporado no médium)

 Sem nenhum preâmbulo, tomamos o fio do diálogo com este companheiro no exato momento em que ele, já magnetizado e depois de reagir bravamente à indução, mergulha nas memórias de uma remota existência. É ele quem começa a falar:

Está quente hoje. Muito calor...

Onde você está?

Estou na minha casa. Atendo aos meus fregueses. Sou um mercador. Vendo potes, óleos e vinhos.

Você é muito rico, então?

Sou. Vendo, também, tapetes, que mando vir da Pérsia. Peles, vendo peles. Moro aqui na Samaria.

Você é samaritano, judeu ortodoxo ou de outra nacionalidade?

Não ligo para essas coisas. Meu pai veio de longe.

Você já havia nascido ou nasceu aí?

Nasci aqui.

O que aconteceu aí? Conta, por favor.

Vendo vinhos, óleos, sedas, peles. . .

Sua casa fica na beira da estrada? E você via todos os que passavam por ali?

— É.

E em determinado dia passou uma pessoa muito importante para a sua vida, para o seu espírito. Que foi que aconteceu naquele dia? Como foi essa história?

Não há histórias. Só escuto falar tanta coisa... E falar e falar...

Um momento, também O viu.

Sim. E daí?

E o que aconteceu quando você O viu?

Não lhe dei importância nenhuma. Eu não O vi. (Pausa). Sálvia... minha... Ela é muito jovem. Falam, falam e ela ouve o que essas mulheres falam. Elas se reúnem e falam. Deviam estar mais ocupadas. Não gosto que ela me ajude, porque ela é muito bela e, às vezes, descobre o rosto. Não gosto que a vejam.

Foi aquela seda... que veio de longe. Eu a presenteei a ela. Tinha uma substância qualquer, algo que a cegou. Ela deixou de ver.

Não pode ser isso. Você quer dizer que você, um comerciante experimentado, deu à sua esposa um tecido que a cegou?

Só pode ter sido isso. Que mais a teria cegado? Um dia ela apareceu cega. Daí, ela ouviu aquelas histórias. (Acerca das curas de Jesus). Eu a proibi. Busquei os médicos de Jerusalém, levei-a ao Templo. Deram banhos e óleos e nada adiantou. Um dia em que pernoitávamos em Jerusalém, ela, como sempre, se associou com algumas mulheres que e conheciam e, contra as minhas ordens, (diz isso com ênfase), foi atrás de uma lenda e de um homem que podia curar. 

Nenhum homem cura... Ela foi lá. (O relato sai aos pedaços, penosamente, como se ele ainda relutasse em aceitar os fatos e tivesse vergonha em reproduzi-los). Naturalmente os remédios para os olhos... Tudo isso, você sabe, pode acontecer depois, não é? Efeito remoto. Ela voltou boa, mas cismou que foi o homem que a curou.

 Eu não queria que ela falasse naquilo porque estávamos hospedados na casa de um mercador amigo, muito rico e que, além de mercador, fornecia ao Templo e a pessoas do Sinédrio, e eu também servia a pessoas do Sinédrio. Voltamos para a Samaria, mas ela nunca mais foi a mesma. Vivia pelos cantos, os olhos perdidos no espaço, como se estivesse tendo visões. E toda pessoa que chegava, todo viajante, ela procurava saber, pedia notícias. E isso me incomodava.

— E Ele passou lá um dia?

Ele passou. Eu não estava porque tinha ido buscar uma partida de sedas. Acho que ela se foi...

Nunca mais você a viu? Ela foi embora?

Ela perdeu-se naquela multidão que O acompanhava. Eu a vi, sim, mais tarde. Depois que tudo havia passado. (Estes companheiros evitam menção direta à crucificação).

No mundo espiritual, portanto, como Espíritos, você e ela?

Não. Eu a vi lá, em Jerusalém, depois que tudo tinha passado e que o criminoso havia sido justamente justiçado.

E o que foi que aconteceu? Você a levou para casa?

Ela confessou-se cristã. Ela confessou-se.

E você, o que fez?

Eu queria... eu deveria tê-la chicoteado, mas eu a amava muito. Então eu a defendi, dizendo que ela estava louca. E acho que estava mesmo louca. Aqueles olhos ficaram vendo visões. Abandonou as sedas. Eu a levei de volta para casa e a trancava num quarto, mas quando eu não estava ela escapulia, para distribuir as nossas coisas, para levar alimentos a míseros leprosos. 

E um dia, eu... (Longa hesitação) Um dia eu... confrontei-a. Segurei-a pelos cabelos, bati-lhe com a cabeça na parede, chicoteei-a e, como ela nada dizia — pois acho que já nem mais me amava — nem os deveres de esposa ela os queria cumprir... Só falava naquele Rabi, naquela visão, naquele Reino estranho a mim. E dizia que os miseráveis, os pobres, os leprosos eram seus irmãos.

— Mas o que aconteceu então? Você disse que a pegou pelos cabelos... Ela morreu?

Não sei, porque depois de tudo eu a arrastei pela porta e a joguei do lado de fora. Arrastei-a por um pedaço da estrada e larguei-a, para que os irmãos dela fossem tomar conta.

E você nunca mais soube dela?

Não quis mais saber.

Mas, meu querido, se entendi bem, é uma história ao mesmo tempo muito triste, muito dolorosa, mas que você, meditando bem, encontra nela muitas belezas também, porque você viu...

Só loucuras... só loucuras!

Não. Escute.

Como você pode enlouquecer de amor por um homem que morreu numa cruz? Que nem sabia vestir-se bem?

Sim, mas Ele não restituiu a visão a ela? Ou você acha que foram os sacerdotes com os seus bálsamos e seus óleos?

Nunca quis saber.

Não quer saber, ainda, agora?

Que diferença faz?

Muita.

Já faz tanto tempo! E nunca tive o filho que queria, para continuar com a nossa tradição.

Mas, de tudo isso o culpado é o Cristo?

Ele roubou-me o filho, roubou-me a felicidade, roubou-me os sonhos da juventude. Roubou-me tudo. Fiquei um homem rico, cada vez mais rico e cada vez mais só. Cada vez mais só... Isso me dava uma agonia que me matava.

Sim, mas aquela vida também terminou um dia e você foi para o mundo espiritual. Como foi que terminou aquela existência? Você estava muito velho?

Não estava muito velho. Você sabe, aquela seita espalhou-se como uma praga rasteira, como um fungo terrível. Houve uma época em que todos eram perseguidos, e eu procurava identificar em minha tenda aqueles que eram da seita. Eu os denunciava, para vingar-me. Nunca mais a vi. Ela era tudo para mim. Até hoje não sei se a matei ou não. Eu me sinto um assassino.

Agora vamos voltar aqui, ao presente, trazendo estas memórias, mas principalmente, meu querido, a lembrança daquele Espírito a quem você amou e, portanto, continua amando. Aquele Espírito que sobreviveu e lutou por um ideal, que aceitou as suas punições e as dores pelo amor, não apenas de um ser, mas de um novo ideal de vida que ela soube compreender e que você tenazmente recusou. 

Os séculos se passaram, ela caminhou e você não quis segui-la. Não é porque ela foi roubada de você; é porque você não quis ir com ela. Ela não se desinteressou de você. Pelo contrário, através desse tempo todo, tem estado em busca do seu Espírito e você sempre a fugir dela.

Você me está causando uma coisa estranha! Sim, é verdade, é verdade. Ela veio ajudar-me. Tão bela e tão pura. Mas eu continuava muito preso ao dinheiro. Tinha mágoa por causa do abandono. Sou um homem muito infeliz. Fui muito infeliz.

Mas, meu querido, não é infeliz aquele que tem o amor tão puro de um ser que desde a primeira hora dedicou-se ao serviço do próximo na tarefa de divulgar a mensagem do Cristo. Ela certamente está à sua espera novamente. Por favor, não a decepcione outra vez. Fique conosco. 

Não te podemos prometer o impossível, mas talvez ela tenha condições de estar com você no mundo espiritual, onde vocês possam ter um reencontro e você possa compreendê-la de outra maneira. Pelo fato de ela amar o Cristo não deixou de amar você. Tanto é que voltou em outra vida para tentar recuperar o seu Espírito.

— Rosa Malena não era minha esposa. Era irmã... Eu a repudiei porque era piedosa demais. Era rica e bela, mas vivia metida com os pobres sujos e queria que eu a ajudasse. E eu a expulsei de casa. Eu tinha um gênio terrível.

Escute, meu querido. Isto agora são memórias que você precisa enfrentar para aceitar essa realidade do amor, da qual você foge. Não vamos exigir de você uma aceitação total, súbita e imediata de tudo aquilo que o Cristo pregou; você tem, ainda, um longo caminho de aceitação a percorrer.

Por duas vezes eu a expulsei de minha casa...

Dê uma oportunidade ao seu Espírito e dê também uma oportunidade a este ser tão dedicado a você, tão puro, tão amoroso, de o ajudar como irmã, como companheira, como amiga... Está de acordo?  Você não gostaria de estar com ela novamente?

Como? se a expulsei duas vezes...

Mas ela não o odeia por isso. Ela tentará outra vez e outra vez, porque aquele mesmo Cristo, ao qual tão bem compreendeu nos primeiros tempos, nos ensinou a perdoar não apenas sete vezes, mas setenta vezes sete. Aceite o perdão que ela lhe oferece e vá ao encontro dela. Vamos ajudá-lo.

Mas se ela era humana, por que não queria as alegrias e os prazeres humanos?

Meu querido, as alegrias e os prazeres humanos não são incompatíveis com o amor a Deus e aos outros seres. Podemos, enquanto estamos encarnados, levar uma vida perfeitamente normal e servir ao próximo e procurar compreender os nossos problemas e a amar o semelhante, que somos também um deles. Está de acordo? Você fica conosco, então?

Depois que você me reduziu a isto, para onde eu irei?

— Não é nossa intenção humilhar nem trazer-lhe dores inúteis. Era preciso, porém, que você desse este mergulho no passado para entender tudo isso de um outro ponto de vista, num momento de lucidez, de calma...

Entender o quê? O Cristo continua golpeando-me.

Não, meu caro. Ele está à sua espera desde aquela época. Você é que não quis segui-lo. A sua amada, a sua Sálvia, O seguiu e tomou-se muito feliz. Por que você não quer ser feliz com ela? Não será isso orgulho seu? Você não pode descer do seu pedestal? Por que você não pode descer?

Mas o Cristo é inatingível. É complexo.

— Não é, não. Como é que ela O aceitou?

Eu não O compreendo.

É porque você quer chegar a Ele pela inteligência, pelo intelecto, pela razão fria; ela chegou mais depressa do que você. Como é que ela O entendeu? Ela é mais brilhante do que você? Não. É mais amorosa. Você não percebe que o caminho do amor é mais curto? Por que você perdeu esse tempo, fez tantas voltas e deixou passar tantos séculos?

Ela submeteu-se, deixou-se dominar.

Não parece, não... Um ser que tem essa lucidez, essa calma, esse equilíbrio, está dominado? Está mais liberta do que você, meu querido. Ela é que está liberta. Você está preso aos seus rancores, às suas decepções, ao seu orgulho.

Eu já tive vidas religiosas.

Mas não amou o Cristo. Não é preciso que você agora se transforme perfeito, mas comece a reconhecer as suas faltas, para que possa libertar-se. Temos que interromper aqui a nossa conversa. Você, por favor, fica conosco então. Se for possível, iremos depois ao mundo espiritual para estar com você e colocar em repouso, pacificar um pouco o seu Espírito, para que você possa entender tudo isso. Está bem?

Sim.

— Você me perdoa, sim? Não leve a mal algumas frases mais rudes que trocamos de início, porque...

Sinto-me tão só...

Você não está só. Está conosco. Aqueles mesmos companheiros que você, na época, não entendeu, muitos dos quais você talvez tenha até denunciado, como disse, são aqueles que querem ajudá-lo hoje.

Sempre me senti tão só. Tive tantas mulheres e sempre me senti tão só... Falta-me algo. Falta-me ela...

É isso mesmo. Falta o amor que você recusou, mas que está ao alcance da sua mão.

O Espírito é retirado com uma palavra de carinho e de esperança e uma solicitação para que se dirija, em pensamento, à sua amada. Essa história é a de mais um irmão desorientado que não conseguiu aceitar o Cristo, nem mesmo depois da cura da mulher que ele amava. Ao contrário, fixou nEle o seu rancor e cristalizou-se na incompreensão, enquanto ela seguiu a rota evolutiva, servindo à causa do amor ao próximo. Esse amor abrangente e transcendente incluía também o rico mercador da Samaria. Ele poderia ter seguido o caminho com ela, rumo às paragens da luz. 

Preferiu bater-lhe com a cabeça nas paredes e arrastá-la para a estrada, onde a abandonou. Voltou para as suas riquezas, seu orgulho, seus preconceitos e sua solidão. Para ele, o Cristo era o culpado de toda aquela desgraça...

 

Séculos depois, quando ela retomou à carne, na condição de irmã, novamente o convidou para a sublime tarefa da caridade e ele, novamente, a expulsou de casa e voltou-se para as suas riquezas, seu orgulho, seus preconceitos e sua solidão. Finalmente, viera encontrar atenção e carinho, calor humano e acolhimento justamente entre aqueles míseros seguidores do Cristo que ele combateu tenazmente durante quase dois mil anos...

Fonte:  http://ensinamentos-esotericos.blogspot.com

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